O triste fato ocorreu no Rio de Janeiro. A cena terrível, na saída de uma escola. A vítima, ainda, menina, viu-se estirada na calçada, graças à bala de revólver que lhe atingiu o pescoço. É difícil afastar da memória a imagem da inocente ferida, entre populares curiosos.
Diante do quadro, a primeira emoção leva a pensar por que o fadário reservou-lhe tal infortúnio. E, não a outro, velho, desenganado ou cansado de viver. Vem então a preocupação com os mais próximos, nossos parentes e amigos.
Em seguida, sente-se certo alívio pela complacência do destino. Muitos podem não se incomodar com a notícia. "Risco de quem reside no grande centro urbano" – murmuram os mais insensíveis. No íntimo, outros dirão que surge uma fatalidade não diferente das demais, virando a página do jornal.
Foge ao razoável, contudo, fechar os olhos para o acontecimento, pois as tragédias cotidianas não têm o dom de afastar o exame das causas dessa espécie de ocorrência. Nem se pode simplificar a reflexão, afirmando que o problema circunscreve-se à violência carioca, com o objetivo de regionalizá-lo.
Exatamente, quanto à atuação dos corpos de guarda privativos, nascem inúmeras dúvidas: podem-se criar milícias privadas? O caos da segurança pública autoriza a autotutela dos indivíduos? São os chamados "seguranças" aptos para essas funções? Alguém lhes fiscaliza a atividade e contratação?
O querer respostas exige não negar a realidade. Logo é preciso partir a discussão da evidência de que há crescimento da atividade particular, na proteção da incolumidade das pessoas e do patrimônio. Não obstante, este seja dever primordial do Estado (art. 144, da Constituição República)
Aliás, também, cabe à Administração Pública fiscalizar a prestação de serviços na área de vigilância, em razão dos possíveis riscos ao bem-estar da população (Lei nº 7.102/83). Entretanto, quando se observa que grande parte desses seguranças são policiais - em horário de folga, trabalhando sem registro, de forma clandestina - a inércia estatal escancara-se.
Vive-se nesse serviço em absoluta ilegalidade. Os contratantes descumprem a lei, os contratados cometem infrações disciplinares, o governo furta-se da tarefa de vigiar e reprimir o setor. Todos, enfim, desconversam, ao se perquirir a respeito do eventual perigo na existência de "mercenários da segurança", hoje, em número maior do que as Polícias somadas.
Em verdade, pouco se faz em prol da paz pública, em consequência da conhecida improvisação à brasileira ou de interesses escusos, voltados à mal intencionada "privatização" da segurança.
O Executivo, ao invés de apresentar projetos de lei, supostas panaceias para a questão da criminalidade, deveria cumprir a incumbência legal, pondo fim aos desvios das guardas particulares.
Assim, fatos como o lembrado seriam evitados e cada um de nós poderia caminhar tranquilo, sem medo da guerrilha urbana, fomentada pela face preguiçosa e irresponsável do Estado brasileiro.
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